Susana Santos

Directora de produção

"Sem pretensiosismos, educa crianças e reeduca adultos." É assim que Susana Santos, 40 anos, descreve o programa “Príncipes do Nada”, cuja produção acompanha desde a primeira série em 2005. Após terminar o curso de Ciências da Comunicação na Universidade Nova de Lisboa, Susana começou a estagiar na SIC no Primeiro Jornal e Jornal da Noite. “Esta Semana” com Margarida Marante e “Hora Extra” de Conceição Lino são alguns dos programas emblemáticos da estação de Carnaxide nos quais Susana assegurou a produção. Em 2004, desafiada pelo realizador Ricardo Freitas, passou a fazer parte da equipa da Até ao Fim do Mundo. Com o programa “Príncipes do Nada” diz que o seu modo de ver e estar no mundo se alterou. Hoje, acredita que existem realmente príncipes do nada.

Quais são os maiores desafios para produzir um programa como o "Príncipes do Nada"?

A selecção das histórias e a logística inerente à deslocação da equipa. No caso do “Príncipes do Nada”, sabemos à partida que a visibilidade que damos às histórias terá as suas repercussões. Por isso, do ponto de vista profissional a enorme responsabilidade na escolha das histórias: ter a certeza que o que mostramos ao espectador é exactamente o que se passa no terreno antes da equipa de filmagens chegar e quando a câmara de filmar se desligar. Pessoalmente, a maior responsabilidade é ter a noção que aqueles minutos de exibição da reportagem em televisão podem modificar a vida dos intervenientes. E sempre que estamos a produzir uma história deparamo-nos com outra e mais outra e outra que também podiam ser objecto de reportagem. E aí é inevitável a pergunta: porquê esta história e não a outra?

E logisticamente, é muito difícil?

Temos sempre uma agenda de trabalho muito exigente (numa deslocação de sete dias, cinco dias são para fazer reportagem, um dia para a viagem de ida e um dia para a viagem de regresso), por isso importa garantir que tudo corre na perfeição. Um imprevisto pode colocar em causa toda a agenda.

Qual foi o país onde foi mais difícil fazer a produção do programa?

Indonésia foi o nosso primeiro destino, em concreto a região de Banda Aceh que tinha sido completamente devastada pelo tsunami de 2004. Recuando a 2005, ano em que a primeira série dos Príncipes do Nada começou a ser produzida, diria que esta deslocação foi a mais difícil. Não pela dificuldade em encontrar histórias no terreno, mas por razões muito concretas: era a primeira saída em reportagem para os “Príncipes do Nada”, acrescida da responsabilidade de estarmos a criar um formato de programa que existia apenas na cabeça da Catarina e do Ricardo; Aceh era uma região politicamente “acesa” com os movimentos separatistas muito activos, o que implicava riscos acrescidos para a equipa; com a região completamente destruída, era muito difícil arranjar as condições mínimas de alojamento, alimentação e deslocação para a equipa.

Houve alguma reportagem que te tenha marcado mais?

A primeira reportagem que fizemos em Timor-Leste. Depois de Aceh seguimos para Timor e em Quelicai encontrámos o Padre João de Deus. Um transmontano que vivia em Timor há mais de 40 anos, um senhor já de uma certa idade... A força interior de acreditar que sozinho conseguia (e conseguiu) ajudar aquele povo era extraordinária. As suas histórias de auxilio à resistência timorense que se escondia nas montanhas (Quelicai é uma região de montanhas), a obra feita em prol da comunidade local com os jovens (educação sexual) e com as crianças (alimentação e habitação) mostrou-me que realmente existem príncipes do nada.

E o que significa exactamente “Príncipes do Nada”?

Todos somos príncipes do nosso reino privado. Os que pouco, muito ou nada têm. Tanto são príncipes do nada os que abandonaram a sua riqueza e partiram em auxílio dos que vivem com nada, como são príncipes do nada os que (sobre)vivem na riqueza do seu nada.

Em que sentido é que um programa como este pode fazer a diferença?

Faz toda a diferença. Em nós e nos outros. Faz-nos redimensionar prioridades e percebermos que afinal os nossos “grandes problemas” do dia-a-dia são “pequenos problemas”. É o tipo de programa que nos faz “descer à terra”. Esta consciência de outras realidades e de outras necessidades traduz-se, muitas vezes, numa ajuda efectiva aos outros. Recordo-me que na primeira série, no dia seguinte à exibição do programa, os telefones não paravam de tocar na produtora. Imensas pessoas queriam dar o seu contributo sob diferentes formas: dinheiro, material escolar, roupa, até o seu tempo. Efectivamente desperta consciências.

O que é que o "Príncipes do Nada" pode oferecer ao público que o acompanha?

É um programa informativo, sem dúvida, mas tem muito de educativo. Informa sobre o trabalho das várias organizações não-governamentais que estão em países tão diferentes como Timor-Leste ou o Sudão do Sul; informa sobre os projectos em desenvolvimento, alguns deles criados com o nosso dinheiro; informa sobre a cultura, religião e educação dos países que visitamos. Tem, portanto, uma vertente educativa que está longe do simples entretenimento. Sem pretensiosismos, educa crianças e reeduca adultos.

Sentes que, de alguma maneira, o programa influenciou a tua forma de estar e de ver o mundo?

Imenso. Tudo o que já disse anteriormente sobre a forma como o programa modifica as pessoas ao torná-las mais conscientes e socialmente mais activas aplica-se a mim.
Permite-me que faça uma sugestão: quem tiver filhos experimente assistir ao programa na companhia deles. Não vão ficar indiferentes. Frases como “tens de comer a sopa até ao fim porque há meninos com fome” ou “não achas que já tens brinquedos suficientes?” começam a fazer sentido depois de assistirem a algumas reportagens.
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